quinta-feira, novembro 25, 2010

"Grande alegria" na jornada do descontentamento



O dia mais longo

Nas centrais sindicais, teve muito mais horas que o costume. Carvalho da Silva e João Proença começaram no início da noite de 23 e só deram por finda a jornada depois das 20 de ontem.

Para o snack-bar 'O Saboroso', a greve geral começa bem. Ao balcão, Nuno, 36 anos, já perdeu a conta às imperiais. "Foram umas 100 na última hora. Devíamos ter encerrado à meia-noite, mas ficámos até este pessoal querer." O "pessoal" é o piquete de greve do Metro, que fechou portas às 23.30 e se junta, coletes encarnados (CGTP) e amarelos (SINDEM) na entrada de serviço da estação Parque e, do outro lado da rua, frente ao Saboroso, em amena confraternização. No meio da pequena multidão está o líder da Intersindical, Manuel Carvalho da Silva, para quem esta é a quarta paragem da ronda nocturna que iniciou às 20.00 no aeroporto, na entrada de turno dos sapadores bombeiros (o secretário- -geral da UGT, João Proença, começou às 21.30 na Carris e entra no dia 24 nos Serviços Municipalizados de Loures).
Francisco Louçã passou cá mais cedo, Garcia Pereira, do MRPP, fica uma hora e ainda vão aparecer Francisco Lopes, candidato do PCP à presidência, e o secretário- -geral dos comunistas, Jerónimo de Sousa.
Do balcão do Saboroso, Nuno enfrenta imperturbável tanto entusiasmo. "Porque é que havia de fazer greve? Para protestar? Por que é que havia de protestar? Se não estiver bem mudo-me." Garante até que "há muita gente que não quer é trabalhar, preferem receber o subsídio de desemprego". O grevista Luís Assunção, 41 anos, 20 de Metro como "técnico administrativo", assente: "Pois, e o rendimento mínimo."
Asserções que, Rita Santos, 37 anos, operadora comercial (vendedora de bilhetes) e filiada na CGTP decerto refutaria, se com elas confrontada. "Concorri durante dez anos para entrar no Metro porque trabalhava em hotelaria e não tinha nenhuma estabilidade nem progressão na carreira, nada. Queria uma empresa que me desse valor enquanto trabalhadora." E, admite, encontrou - mesmo se hoje está aqui para "mostrar o descontentamento".
Na hotelaria trabalha ainda Carmo, que está de serviço, entrando e saindo da cozinha, no pequeno refeitório da CGTP, onde Manuel Carvalho da Silva e Mário Nogueira almoçam após a conferência de imprensa das 13.00. Caldo-verde, frango assado, arroz de hortaliça a meio de um dia em que a maioria dos presentes não foi à cama e que só terminará perto das 21, após o último "ponto da situação" para a imprensa. Questionada sobre se está a fazer greve, Carmo primeiro diz que sim, mas acaba por confessar que não. "Acho que vou receber este dia, se estou aqui. Mas não tenho nada que ver com a CGTP." Uma fura-greves numa das sedes do protesto? Ao lado, Carvalho da Silva sorri, sem comentários.
Ao fim da noite, na reunião final dos dirigentes da UGT na respectiva sede, João Proença adianta uma novidade que talvez explique o paradoxo. "Há muitos trabalhadores que fazem greve, mas depois apresentam uma justificação - baixa ou outra - para receberem o dia." Talvez Carmo, ao contrário, trabalhe e desconte o dia, como o universo dos sindicalistas. Uma trapalhada que explica a assumida dificuldade nas estimativas, mesmo se na conferência de imprensa conjunta, iniciada às 17.00, Proença de Carvalho e Carvalho da Silva garantem a sua "grande alegria" com "uma extraordinária greve-geral em Portugal" e atiram para o alto, adiantando que dos três milhões e 800 mil "trabalhadores activos", um milhão dos quais do sector público, só 800 mil não terão feito greve. As tentativas de perceber o fundamento da estimativa deparam com a refutação irónica dos números apresentados pelo Governo: "A senhora ministra[do Trabalho] diz que nos serviços públicos a adesão andou entre 5% e 95%. Se tivesse dito entre zero e 100% tinha a certeza de acertar."
Quanto aos efeitos práticos da jornada, Proença resume: "É fundamental que não haja um novo PEC e que muitas das medidas sejam alteradas." Carvalho da Silva reforça: "É obrigatória a reposição da protecção social. Queremos diálogo e negociação." Mas a resposta à pergunta sobre pedidos de audiência ao primeiro-ministro e ao Presidente desencadeia uma risada na sala: "Ao primeiro-ministro já pedimos antes. E a qual Presidente?" Carvalho da Silva explica: "Não vejo o professor Cavaco Silva, o actual PR, a pôr em causa a promulgação do orçamento."
Ao fim de quase uma hora de conferência de imprensa, os dois aliados despedem-se dos media: "Obrigada pelo vosso esforço." O esforço de quem, no caso, não fez greve - mas se todos os jornalistas fizessem, para quem falariam os sindicatos?

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